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O pesadelo das gramíneas invasoras das pastagens

por Neivaldo Tunes Caceres

Foto: Neivaldo Cáceres

O título desse nosso artigo mensal é bastante elucidativo e creio que a maior parte dos pecuaristas brasileiros irá concordar com ele. Não há outra palavra que defina melhor o problema das gramíneas invasoras das pastagens que “pesadelo”. Há bem pouco tempo, os problemas com invasoras de pastagens se restringiam às folhas largas, umas mais fáceis, outras mais difíceis de controlar. Umas podendo ser controladas em aplicações foliares em área total, outras só em aplicações localizadas. Nos casos extremos partimos para a aplicação no toco ou basal, mas praticamente todas de algum modo têm solução. Os produtos recomendados para estas plantas são predominantemente seletivos às forrageiras, ou seja, são ativos nas folhas largas, e pouco ou nenhum efeito indesejável se observa no capim. Até que de alguns anos para cá começaram a ser reportados problemas de invasoras de folhas estreitas, as gramíneas indesejáveis. De certo modo, há bastante tempo convivemos com o gramão, o Paspalum notatum, que no Sul do país até é importante como forrageira. O capim-rabo-de-burro, o Andropogon bicornis, também sempre esteve por aí, mas de certa forma o manejo adequado do capim, correções na fertilidade do solo, e algumas intervenções mais pesadas às vezes, como reforma em reboleiras, ou até área total, contornavam o problema. Também no Sul do país, há 50 anos o capim-annoni (Eragrostis plana) foi introduzido indevidamente como forrageira e se provou uma praga para as pastagens daquela região, mas de certo modo descobriu-se controle viável utilizando equipamento de aplicação específico, o Campo-Limpo, desenvolvido pelos pesquisadores da Embrapa Pecuária Sul. Mais recentemente a Digitaria insularis, o capim-amargoso, proveniente de populações resistentes aos glifosato, originárias em lavouras, migraram para pastagens. Neste texto dirigiremos mais atenção aos terríveis capim-navalha ou navalhão, e capim-capeta, que estão avançando de modo assombroso, principalmente nas regiões Centro-Oeste e Norte do país. O capim-navalha O Paspalum virgatum, conhecido por diversos nomes populares como: capim-navalha, capim-navalhão, capim-capivara, capim-duro, santa-fé no Pantanal do MS, cabeçudo em Rondônia e Acre, é uma planta agressiva, que domina totalmente a pastagem infestada. Sua folha possui cerdas laterais extremamente cortantes, que fere a boca e mucosa dos animais que tentam ingeri-la, daí a origem do nome “navalha”. Os animais comem suas inflorescências disseminando-a ainda mais. Estima-se que através do trato digestivo de gado transportado é que houve sua introdução no Pantanal do MT e MS. Quem não conhece e olha de longe, avalia como se tratasse de uma ótima pastagem, analisando de perto, a coisa é bem diferente. Os pecuaristas começaram a notá-la de forma mais evidente há pouco mais que dez anos, tendo a partir daí avançado exponencialmente em área e preocupação para o setor. Há dois produtos registrados para seu controle em pastagens, uma mistura de duas imidazolinonas: Imazapir e Imazapique, com 525 + 175 g ia/kg, respectivamente; e uma formulação de Imazetapir, outra imidazolinona, com 100 g ia/L. Contudo seu controle é complexo. Em área total esses produtos raramente são 100% efetivos. A mistura de imidazolinonas com certa frequência apresenta importantes injúrias nas forrageiras, e o Imazetapir, mais seletivo ao capim, muitas vezes exige altas doses, se não aplicações sequenciais, em intervalos de aproximadamente dois meses. A boa alternativa desses dois produtos é em aplicação localizada, porém se alia a isso o baixo rendimento operacional inerente da modalidade de uso. Em aplicação localizada cuidadosa, até o glifosato pode ser uma alternativa. Outro problema identificado mais recentemente é que na verdade não se trata de uma única espécie de navalhão. Há uma, ou mais espécies, com folhas mais finas, inflorescências com espiguetas mais numerosas, plantas de menor porte, que estão sendo chamadas no campo por “capim-navalhinha”. Não consegui uma identificação precisa da espécie, mas pode se tratar de Paspalum intermedium e/ou Paspalum urvillei. O problema não é a identificação precisa, mas o comportamento diferenciado que essas espécies possuem em relação à susceptibilidade aos tratamentos herbicidas. Na maioria das vezes os tratamentos mencionados anteriormente são efetivos no navalhão e não são no capim-navalhinha, trazendo outro desafio para os pecuaristas e técnicos que trabalham com o manejo de plantas daninhas em pastagens. Acredito que nesses alvos, a opção da aplicação localizada seja a única alternativa de controle. Figura 1. Área infestada por capim-navalhão no Mato Grosso

(Foto: Neivaldo Tunes Caceres) Figura 2. Detalhes da planta do capim-navalhão e sua inflorescência

(Foto: Neivaldo Tunes Caceres) Figura 3. Detalhes planta do capim-navalhinha e sua inflorescência

(Foto: Neivaldo Tunes Caceres) O capim-capeta O Sporobolus indicus, conhecido pelos nomes populares: capim-capeta ou capim-pt, representa, a meu ver, o maior desafio da atualidade, tratando-se de gramíneas invasoras de pastagens. Sua presença começou a ser notada posteriormente ao capim-navalhão, mas tem se disseminado de forma muito mais agressiva, e dominado a paisagem onde surge. Áreas que há dois ou três anos não registravam sua presença, hoje estão tomadas por essa invasora. Em 2015 ela foi objeto de um Comunicado Técnico (268) da Embrapa Amazônia Oriental onde o autor, Moacyr B. Dias-Filho, traz importantes informações a seu respeito, com números preocupantes sobre sua capacidade de produção de sementes: 200 mil por planta por ano; a longevidade de sobrevivência dessas sementes por até 10 anos no solo; e um potencial de banco de sementes viáveis no solo de 20 mil sementes/m2. A disseminação de suas pequeníssimas sementes é extremamente eficaz através do vento, implementos agrícolas, pessoas e animais, pois estas, ainda quando maduras, são recobertas por uma mucilagem viscosa que adere a qualquer superfície que as toca, sendo assim facilmente transportadas. Suas folhas são extremamente finas, como se fossem linhas, com pontas quase sempre secas, e o topo da planta sempre repleto de inflorescências, na maior parte do tempo secas também. Dessas características já se tira a informação que o implemento Campo-Limpo, eficiente no controle de capim-annoni, é totalmente ineficaz no combate a essa planta, uma vez que as partes embebidas em herbicida do equipamento atingem partes da planta totalmente desprovidas de superfície de contato e que não promovem absorção. Há quem se confunda que o capim-annoni e o capim-capeta sejam a mesma espécie, estamos falando de Eragrostis plana e Sporobolus indicus, respectivamente. Seu controle químico no campo é um grande desafio. O glifosato em aplicação localizada seria uma opção, mas impraticável na maioria das áreas pela altíssima infestação. Aplicado em área total em dessecação da pastagem pré renovação é uma importante ferramenta, mas em nada auxilia com o banco de sementes do solo, que fatalmente virá após o plantio da área, onde aí pode entrar a Atrazina em pré emergência como opção. Nas plantas adultas, a Atrazina tem se mostrado a única opção, mas em altas doses: 10 L/ha ou mais, com excelente seletividade à pastagem, mas com dois problemas: não há formulações registradas para uso em pastagens; e sua ação é efêmera, ocorrendo um total secamento das touceiras do capim-capeta por 50 a 60 dias, e posteriormente estas rebrotam em sua totalidade, ou seja, é proporcionado um efeito temporário, que beneficia a pastagem e permite sua recuperação, mas o controle não é efetivo. Na maioria dos casos a renovação da pastagem, com a prévia dessecação, é a única solução, ainda que momentânea, como alertado anteriormente devido ao banco de sementes existente no solo. Figura 4. Área infestada por capim-capeta no Pará

(Foto: Neivaldo Tunes Caceres) Figura 5. Detalhe da planta do capim-capeta e sua inflorescência

(Foto: Neivaldo Tunes Caceres) Um programa de controle de gramíneas invasoras O pecuarista que possui uma propriedade infestada por gramíneas invasoras deve se conscientizar que seu combate será uma atividade rotineira e permanente dentro de seu quadro de atividades. Não pense que uma única ação, operação ou aplicação de herbicidas será a solução dos seus problemas. Deve-se estabelecer um programa de combate, na maioria das vezes por vários anos no mesmo local. A catação localizada anual química, ou até mecânica com arranquio, pode ser uma estratégia, caso o nível de infestação seja administrável por essa prática. Outra estratégia, em infestações maiores, seria uma aplicação em área total na época das águas, onde se obtêm uma redução significativa da população infestante, e na próxima estação chuvosa se faz o combate localizado, sempre mais efetivo que o que se terá com aplicação tratorizada ou aérea. Implementada esta ação de pelo menos dois anos, daí o segredo é sempre lembrar que qualquer retrocesso no controle dessas pragas cobrará um esforço de como se nada tivesse sido feito anteriormente, tudo voltando à estaca zero. Um ponto que creio ser importante mencionar também é que a roçada anterior à aplicação não melhora a eficácia dos herbicidas, principalmente pensando no capim-navalhão, pelo contrário, piora sua eficiência. Isso se deve ao fato que as folhas são a porta de entrada do herbicida na planta, e uma planta roçada significa menor superfície de contato e penetração de produto na planta. Esse é um paradigma no campo, que prega essa recomendação, crendo que na planta roçada a performance do herbicida é melhor. Única condição que a roçada poderia ser benéfica seria no caso de fim de estação seca, ou início de estação chuvosa, onde se faria a roçada para eliminar a macega seca de longa data, e se aguardaria um volumoso e vigoroso rebrote, com 30 dias ou mais, e nessa condição se faria a aplicação de herbicidas. Ai sim se teria uma condição favorável, mas nesse caso estamos agregando o custo de uma roçada, e isso teria que ser computado. Além do herbicida Algumas práticas podem e devem ser complementares ao controle, ou convivência com estas invasoras, que não envolvem propriamente herbicidas, seriam as chamadas práticas culturais. Ações que muitas vezes não têm custo, e podemos citar: primeiro a escolha de sementes de qualidade, de boa germinação e pureza, que não tragam sementes indesejadas para a pastagem. Aliada a isso, a escolha da espécie forrageira que melhor se adeque às condições edafoclimáticas do local. Tratando-se de renovação de pastagem infestada pelas gramíneas invasoras citadas nesse texto, dependendo de relevo e tipo de solo, a alternativa de rotação de culturas é das mais indicadas. Ideal que se possa conduzir dois ou três anos de lavoura na área, utilizando herbicidas graminicidas, que nesse período combatam consistentemente as sementes que germinarão ao longo dos ciclos das culturas. E finalmente, estabelecida a pastagem, que seja respeitado o criterioso manejo da pastagem, com entrada e saída dos animais nas alturas adequadas de corte para cada espécie, impedindo a ocorrência de sub ou super pastejo, cruciais para que não surjam áreas de solo descoberto, e o capim possa exercer competitividade sobre as plantas indesejáveis. Não se esquecer também das adubações de manutenção e calagem, sempre que a análise de solo indicar necessidade, sempre pensando em dar ao pasto os recursos necessários para que a disputa com as invasoras seja vencedora.

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